Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 17-01-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2123
Dia da semana: Sábado
Página: 1
Coluna: 3
Caderno: Colaboração
Manchete: CARTAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE CORA POR LINO COUTINHO PRIMEIRA PARTE CARTA XI
Texto:
Há bastantes modos e meios, vós bem sabeis, de ensinar os meninos a ler e escrever sem o temor dos Mestres, e nem haverem horas certas de estudo; e por meio de puros jogos de cartas, e pinturas, nesta idade se consegue um fácil ensino destas regras sem se amofinarem as crianças, que bem pelo seu contrario correrão para ele, como para um divertimento. Bem conheço que semelhante método é impraticável nas escolas públicas, onde devem aprender muitos meninos juntos, e onde por isso é preciso sistema e Regimento; mas quando se trata do ensino de um só, o seu Mestre se deve guiar pela natureza infantil. Nada de ortografia e preceito de gramática são necessários nesta primeira instrução[2] e nunca se repreenda Cora por sua má linguagem, a qual ainda que mais naturalmente deduzida do que a dos literatos, é com tudo, nesta idade, viciosa à vista dos preceitos da língua; e não repreenda, porque ela se corrigirá com o hábito do nosso justo modo de falar, com a leitura dos clássicos, quando bem souber ler, e com a conservação de pessoas instruídas; pelo que deveis pôr todo o cuidado em que ela evite e desconheça a linguagem estropiada dos escravos africanos, e da gente mais baixa, que de ordinário fala mal e viciosamente. Não ensineis a Cora em tão pequena idade palavras esquisitas, e nem termos e maneiras afetadas de política, como fazem muitas Mães especiosas, porque isto em uma criança que não conhece senão a liberdade da natureza, provoca riso e a [... ]. Abandonai esses cumprimentos e maneiras atenciosas ao tempo e à idade, que farão os seus deveres; pois que é com a freqüência das boas e honestas sociedades e com o trato da gente polida, que se adquirem as boas maneiras e a civilidade. (...)
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 05-02-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2137
Dia da semana: Quinta-feira
Página: 1
Coluna: 5
Caderno: Folhetim
Manchete: LUCIA Romance Original DE D. Anna Ribeiro de Góes Bittencourt NATURAL DA BAHIA LUCIA I
Texto:
Atravessa os charcos miasmáticos sem ver que suas vestes se enxovalham, seu aspecto torna-se asqueroso, e que finalmente, perde seu caráter essencial: deixa de ser poesia.
- A teu ver o que deve ser então a poesia? Perguntou Sylvio.
Deve ser a virgem imaculada, vigorosa e bela. Sua mão direita deve sustentar a coroa de louros para cingir a fronte de seus eleitos, e a esquerda espargir flores que purifiquem o ar em sua passagem. Não deve ter lânguidas doçuras da Vênus do paganismo, mas também não deve ostentar a heróica tristeza, as formas colossais das raças primitivas, ou dos filhos dos Titãs, como a musa de Guerra Junqueiro.
Isto amedronta e afugenta. Seja forte, mas de formas graciosas e suaves. De seus olhos devem brotar centelhas de luz que irão aviventar seus filhos, e eles trabalharão para a grande reforma social com as armas da razão, da caridade e do amor.
E quando for preciso castigar o vício? Replicou Sylvio.
Quando assim seja, respondeu Probo, sua mão poderosa, como a do Jupta mitológico, depondo a coroa de louros impunha o raio que fulmina, e nunca o látego que avilta e degrada.
- Acho que tens razão, disse Baptista. Quando ergueu-se em nosso país o brado da redenção do escravo os nossos mais caros poetas, como Castro Alves, Cyridião Durval e outros, não retalharam com o azorrague infamante os verdugos dos míseros filhos de Agar; mas com os raios do seu verbo patente fulminaram, os aplausos calorosos das turbas, o monstro da escravidão:
Quando a lira do poeta
Desce os antros da senzala
Onde a miséria campeia,
Onde o azorrague é que fala;
Ora escutando um gemido
Ora um soluço partido
Nas agonias da dor;
Vibra logo em cada verso
Um raio perverso,
Maldição pra tanto horror!
- É verdade, disse Julio. Era assim que o nosso Cyridião Durval, verberando os tiranos senhores eletrizava as multidões, fazendo-as aderir finalmente à grande idéia.
Que triunfou sem espada nem canhão, acrescentou Probo, como ainda nos diz o mesmo poeta.
Quebremos todos os elos
Desta cadeia fatal,
Que prende ao poste da infâmia
A nossa vida moral!
Para abater as senzalas,
Não precisamos de balas,
Tem muito fogo a razão;
Nas lutas da caridade,
Em quanto fala a piedade,
Guarda silêncio o canhão.
- Mas se para castigar for preciso descer aos antros do crime e de lá arrancar os monstros sociais? Perguntou Baptista.
Esta tarefa, respondeu Probo, pertence à velha prosa...
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 25-02-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2153
Dia da semana: Quarta-feira
Página: 1
Coluna: 3
Caderno: Folhetim
Manchete: LUCIA ROMANCE ORIGINAL DE D. Anna Ribeiro de Goes Bittencour NATURAL DA BAHIA III
Texto:
É preciso muito dinheiro para fazer-se boa figura na sociedade, e não dar àquelas que querem nos suplantar.
Lucia sorriu-se; as duas moças deixaram a janela, porque já começavam a contratar pares para a primeira quadrilha.
Arthur, sem perda de tempo, correu para junto de Lucia.
- Já tenho par, respondeu a moça ao pedido da primeira quadrilha.
{...}
A esse tempo o dono da casa com os homens idosos haviam passado à sola onde estava preparada a mesa de jogo.
Alguns tomaram lugar na banca, e outros formando grupos, conversavam ou tomavam os licores de que estavam sortidos os aparadores da sala de jantar, contígua a de jogo.
{...}
Terminada a quadrilha, Sylvio viera até ali, e introduzira-se na conversação.
{...}
- Apesar de todas vantagens expostas pelo senhor visconde, disse Sylvio, acho que o sistema de meu pai é mais seguro.
Os quinhentos contos que ele tem em apólices, dão-lhe um rendimento certo, embora não seja grande, e organizando o trabalho livre em suas fazendas de café, como tem feito, em breve poderá compensar o prejuízo que sofreu com a perda de mil e tantos escravos, na abolição.
{...}
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 27-02-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2155
Dia da semana: Sexta-feira
Página: 2
Coluna: 2
Caderno:
Manchete: A “LENDA DAS PENEDIAS” À V. MARQUES
Texto:
Era manhã brumosa e fria.
Mulheres de cântaros à cabeça desciam vagarosas, à escarpada sombria do monte do Céu, em cujas raízes, branca de neve- se ergue a vistosa capelinha de Santo Antônio dos Valasques, defendida ao longe por espalmados rochedos que lhe servem de quebra mares.
Tênues fios d’água começavam a orvalhar o relvado luxuriante da campina enquanto ao largo ligeiros bateis de velas enfunadas traçavam linhas indefinidas por sobre as águas tranqüilas da enseada.
Tio André, o velho amigo da gente da freguesia, sentando-se enfim à porta da modéstia Ermida, a tiritar de frio, começou a narração da “Lenda das Penedias”...
Já faz anos, meu moço, ainda não se pensava na guerra do Madeira. Este povoado hoje tão extenso tinha apenas essa Igrejinha e mais umas casas de taipa. O nosso padroeiro, diziam, não consentir se arranca uma pedra àqueles penhascos.
Um dia, porém, um rico e poderoso senhor, dono daquelas terras de além, zombando da crença dos nossos maiores, ordenou a um magote de negros possantes que, armados de alavancas e picaretas – derruíssem os rochedos e com os seus fragmentos carregassem a barca que estava fundeada na curva do ancoradouro.
Embalde o povo clamava – Misericórdia! Embalde! Os negros, impassíveis a tudo, subiram às penedias e, ao primeiro golpe das alavancas, na cava de uma onda sumiu-se a embarcação.
Os profanadores caíram de rojo sobre as pedras e os seus gritos, aterrorizantes, vinham se confundir aos do povo que ainda nesta alpendrada clamava: - Misericórdia!...
E nunca mais, nem os destroços da barca viera, tocar a estas praias, nunca mais!
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 03-03-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2158
Dia da semana: Terça-feira
Página: 1
Coluna: 2
Caderno: Colaboração
Manchete: CARTAS SOBRE A EDUCAÇÃO DE CORA POR LINO COUTINHO SEGUNDA PARTE CARTA XL
Texto:
Tenho-vos falado do marido e dos filhos; agora tratarei da família, de quem sois a natural governante, visto que o homem por sua educação, e mesmo talvez por índole não é próprio para os trabalhos domésticos; e já que por nossa desgraça, minha Cora, nos vemos na necessidade de ter escravos, convém muito que com eles vos mostreis humana e caridosa, ainda que senhora respeitada e obedecida.
Os escravos, por uma rebeldia talvez filha de sua miserável condição, servem ordinariamente mal, e não cuidam, como devem de suas obrigações; mas por fim uma boa educação, quando eles são pequenos, ou boçais, e uma continuada vigilância, e hábito de fazerem as coisas, os torna algumas vezes sofríveis, e mesmo bons.
Os castigos corporais, que prodigamente lhes infligem alguns bárbaros senhores, em vez de aproveitarem, ao contrario só servem de os fazerem indolentes e ruins; e nada é mais feio, aos olhos da razão e do sentimento, do que ver o belo sexo, em cujo coração só deve reinar a paz à humanidade, armado de instrumentos cruéis e despedaçadores para flagelar seus escravos. Longe de vós, minha Cora, semelhante desembaraço e ousadia, que é só própria do homem; e quando eles não vos sirvam bem, e precisem de correção, castigai-os antes com as penas morais, do que físicas, como seja, por exemplo, a privação do vosso agasalho, a diminuição da comida e vestuário, o aumento do trabalho, e por fim a prisão em quartos fechados, ou no tronco, principalmente quando se embebedarem, porque quase todos eles são inclinados a semelhante vício, e quando ainda assim se não queiram emendar, e se façam, ao contrario, criminosos e incorrigíveis, vosso marido que se avenha com eles, e que os venda, porque de outra sorte viverão continuadamente flagelados com o seu mau proceder.
Também a imoralidade das escravas quer do serviço da rua, quer das que se conservam em casa, não pouco mortifica a uma senhora bem educada e virtuosa, e neste caso o melhor expediente é de as casar logo com alguns dos vossos próprios escravos a fim de as coibir, porque se fordes a vendê-las, como praticam algumas senhoras que conheço, nunca mais tereis quem vos serva, visto que todo o tempo será pouco para as ensinar e instruir no serviço da casa, tendo logo de as vender, porque todas elas seguem a mesmíssima vereda.
No entretanto, minha Cora, sede com eles, como já vos disse, humana e caridosa, cuidando de sua boa sustentação, e vestuário, quando sãos, e mandando-os bem curar, quando doentes; por eles, posto que nossos escravos, não deixam de ser nossos próximos, e quem vos alivia do trabalho merece de certo alguma recompensa e gratidão.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 22-04-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2199
Dia da semana: Quarta-feira
Página: 2
Coluna: 2 e 3
Caderno:
Manchete:
Texto:
Titia, estou hoje numa quebradeira única na espécie, nem um magro tostão para cigarros; estou cogitando um meio para obter algum dinheiro; sabe? Lembrei-me de mandar vender uns garrafões vazios bem assim uma quantidade de latas de manteiga que encontrei arrumadas na adega, que acha?
...e a tia Gracinda erguendo-se do sofá, sacudindo o vestido por causa do calor, acrescentou.
- Está tudo que é um Deus nos valha, tudo muito mau. Os bancos quebrados, os inquilinos não pagam, o bicho não dá... Latas vazias tenho para mais de setenta e tantas; caixas de fósforos tenho juntas pra mais de oitocentas, mais de oitocentas em perfeito estado! Ouviu?
- Mas tia Gracinda quanto as latas não digo que não haja razão, mas caixas de fósforos vazias...
Cale a boca meu sobrinho não esteja a falar aquilo que V. não sabe, V. é muito ignorante ainda...
{...}
- Mas tia Gracinda somente onde há muita pobreza é que se dá disto, felizmente nós brasileiros, não temos necessidade de tal.
O que? O que? Não precisamos, e está você aí para uma banda todo macambúzio, mais limpo que uma casinha pintada de fresco.
- Sem! Tido isto por falta de indústria no nosso país.
- Sabes que mais Totonio? Tu está para caçoadas e eu tenho mais o que fazer, e não posso perder tempo com palavreado de moços de República.
- Onde deixei meus óculos! Clothilde, oh Clothilde? Procura meus óculos, anda.
- Onde estavas negrinha? Ah! Estava tirando os araçás que eu reservei para fazer doce não é? Espera que eu te ensino e caminhou para dar em Clothilde.
- Iou non sei non senhora, vuence non boutou in riba da caixinha?
- Não estão aqui, vai ver onde estão.
- Olhe titia, vosmicê está com os óculos na testa.
- Vejam só como ando com esta cabeça, pego nas coisas e não sei aonde deixo, tanta consumição...
E o crioulo, vergando a espinha dorsal, erguendo o joelho e fazendo deste ponto de apoio para o violão, começa a afiná-lo; depois do que encosta-se à esquina, e canta uma por uma as canções pedidas.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 24-04-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2201
Dia da semana: Sexta-feira
Página: 2
Coluna: 3
Caderno: Variedades
Manchete: VIZINHOS
Texto:
Os vizinhos representam papel tão importante nos fatos da nossa vida íntima, que esquecê-los, fora abrir um claro olhar imperdoável na galeria de quadros mal esboçados que aqui expomos semanalmente...
Para isso basta colocar ante os olhos dos leitores o seguinte painel:
Uma família acaba de se mudar.
No dia seguinte àquele em que se estabeleceu na nova residência, a dona da casa, com uma criança ao colo, chega à janela.
Ao lado, outra dona de casa, tendo também ao colo mimosa criancinha, imita-lhe o exemplo...
Comprimentam-se,...
_ Diz adeus à moça nhonho.
O nhonho abre os dedos da mão direita e começa a movê-los maquinalmente.
_ Adeus, meu anjo, acode a vizinha.
{...}
Estão travadas as relações.
_ Daí o dialogo segue, pouco mais ou menos este curso:
_ Eu conheço a senhora de vista, a sua fisionomia não me é estranha.
_ A sua graça? Ainda que mal lhe pergunte.
_ Eulalia uma sua criada....
_Como se chama seu marido?
_ Anacleto Julio do Espírito Santo...
_ Quando a senhora precisar de alguma coisa...
_ Muito agradecida...
_ Entre vizinhos não deve haver cerimônias.
Em seguida passa a Sra. D. Eulalia a contar os trabalhos que teve com a mudança, os martírios que sofre com o mão serviços dos criados...
Finda a longa narrativa, a Sra. D. Eulalia sai da janela, alegando que vai tratar do arranjo da casa.
Conversa da vizinha com outra que mora ao lado:
_ Já conheço quem se mudou para aqui.
_ Eu também
_ O marido não é o sujeito barbado.
_ Chama-se Anacleto Julio...
_ Do Espírito Santo. E sei mais que era viúvo antes de se casar com ela, e que deu muito má vida à primeira mulher...
_ Por mais que eu não quisesse ver sempre via D. Engracia sabe que eu não gosto de saber nada que se passa na vizinhança.
_O mesmo dá se comigo.
_ Enfim Deus os faça felizes...
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 11-05-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2215
Dia da semana: Segunda-feira
Página: 1
Coluna: 6
Caderno:
Manchete: O GRANDE PUTIRUM DO RECONHECIMENTO Pimenta de mais COZINHEIRO EXCELENTE
Texto:
No grande putirum do Reconhecimento.
O Amazonas, o Pará, o Ceará, o Pernambuco,..., o Sergipe, a Bahia... o Rio Grande do Sul...
{...}
Pernambuco ao Rio Grande – Olha aqui este vatapá, oferece-o a Bahia...
O Rio Grande do Sul, apanhando o prato e passando-o a Bahia – Amiga! Um vatapá!...Está cheiro, caramba!
A Bahia – Ó benzinho da gente, meu negro, quanto luxo com a mulata velha! Esta parecendo vatapá de garoupa... Xi! Que cheiroso... Leva uma colherada à boca. Engasga-se, tosse, espirra,...
A Bahia – Pimenta... Pimenta de mais... Malagueta...
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 22-07-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2271
Dia da semana: Quarta-feira
Página: 1
Coluna: 3
Caderno: Folhetim
Manchete: FRANÇOIS COPPÉE ____ SONHOS DA MOCIDADE III
Texto:
Muito moreno, de tez lívida, com o cabelo e a barba muito crescidos, como se quisesse imitar a cabeça do Cristo, o operário, vestido com a sua ampla blusa negra de tipógrafo, realizava perfeitamente o tipo do tribuno de clube.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 30-07-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2278
Dia da semana: Quarta-feira
Página: 1
Coluna: 3
Caderno: Folhetim
Manchete: FRANÇOIS COPPÉE ___ SONHOS DA MOCIDADE IV
Texto:
... Amadeu Violette tinha-se feito pouco a pouco um homem.
Um homem, isto é, um ser que possuía um tesouro cujo preço não conhecia; pouco mais ou menos como um preto do centro da África que tivesse encontrado um livro de cheques do banco do barão Rothschild;...
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 06-08-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2284
Dia da semana: Quinta-feira
Página: 1
Coluna: 3
Caderno: Variedades
Manchete: AS CIDRAS DO AMOR
Texto:
{...}
E o Carlitos começou As três cidras do amor.
{...}
Vinha então o caso da preta muito má, que lá no fim havia de ter seu castigo, e o da princesa transformada em pomba com um alfinete enterrado na cabeça.
{...}
...Recordava-se do final: o príncipe mandando matar a preta, fazendo-lhe da pele um tambor e dos ossos uma escada subia para a cama.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 14-08-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2291
Dia da semana: Sexta-feira
Página: 1
Coluna: 2
Caderno: Variedades
Manchete: O PRAXEDES
Texto:
{...}
À Rua da Imperatriz, no Recife, em escura e mal arejada trapeira, término alcandorado de velho e pesado edifício sem higiene e sem arte, morávamos eu e mais quatros companheiros.
{...}
Dos companheiros de então um havia, o Praxedes, rapaz paraibano, muito louro, franzino e com pronunciados tons da melancolia. Era lírico de idéia e míope de vista. Cavalgava ao nariz grande pince-nez de aros de tartaruga e escrevia versos, que muitas lágrimas compridas fizeram derramar, a boa Izaura, nossa cozinheira, que toda se babava pelos bons modos de seu doutor. E que raivas surdas não tinha a pobre preta quando o estabanado Raul, de chapéu arreliadamente descambado para a nuca, entrava cambaleando pela casa a dentro, madrugada alta, acordando a vizinhança toda, a declamar em altos berros umas quadras canalhas em que o poeta era crismado de chorosa patativa dos sertões de Paraíba!
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 17-08-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2292
Dia da semana: Segunda-feira
Página: 1
Coluna: 5
Caderno:
Manchete: RECEPÇÃO LITERÁRIA E CIENTÍFICA
Texto:
Recebemos:
O TAGARELA....
O n. 75 na primeira pagina traz o retrato da mulata velha com o rosto de Severino Vieira lendo-se no alto o seguinte soneto;
UE, GENTES!
(Para violão)
Ioiô Severino do vatapá
- Moqueca senhô, moqueca sinhá -
Não quer que o teba de seu Rei vá lá
Mexê no tacho do tal Mungunzá;
Diz que seu Rei nunca lá pode entrá
Na governança que vai começá!
Parece um dengo chocho de sinhá,
Toda mi deixes, não seja má!
[...], ai que bom dendê!
[....................................]
Não muchôco nem de Jururu
Mas cuidadinho seu ioiô, não vá
Lá na Bahia se amajambará
E bota tudo num gostoso angu!
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 24-08-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2302
Dia da semana: Sábado
Página: 2
Coluna: 1
Caderno: Para crianças
Manchete: PEDRO MALAS-ARTES
Texto:
Um dia, Pedro Malas-Artes foi ter com o rei e pediu-lhes três botijas de azeite, prometendo-lhes levar em troca três mulatas moças e bonitas.
{...}
Mas adiante, encontrou uns homens que iam carregando uma rede com um defunto. Pedro perguntou quem era, disseram-lhe que era uma moça. Ele pediu para ir enterrá-la e eles a deram. Logo que os homens se ausentaram, ele tirou a moça da rede, encheu-a de bastante ouro e enfeites, e foi ter com ela nas costas à casa de um homem rico que havia ali perto. Pediu rancho, e disse às filhas do tal homem que aquela era a filha do rei que estava doente, ele andava passeando com ela, e pediu que a fossem deitar.
Deitou a moça defunta na cama e retirou-se, dizendo às donas da casa: “Ela custa muito a dormir, ainda chora como se fosse uma criança; quando chorar, metam-lhe a Correia.”
... De manhã ele pediu à moça que queria ir se embora. Foram ver a filha do rei e nada da a poderem acordar. A final, reconheceram que estava morta, vieram dar parte a Malas-Artes. Ele pôs as mãos na cabeça dizendo: “Estou perdido; vou para a forca; me mataram a filha do rei!...” Os donos da casa ficaram muito aflitos, e começaram a oferecer coisas pela moça, e Pedro sem querer aceitar nada, até que ele mesmo exigiu três mulatas das mais moças e bonitas.
O homem rico as deu e disse que dava uma desculpa ao rei sobre a morte de sua filha, e lhe dava de presente as três mulatas, para o rei não se agastar muito. Malas-Artes largou-se e foi para o palácio, onde entregou ao rei as três mulatas com este dito: “Eu não disse a vossa majestade que lhe dava três mulatas pelas três botijas de azeite? Aí estão elas.” O rei ficou muito admirado.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 31-08-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2203
Dia da semana: Segunda-feira
Página: 2
Coluna: 3
Caderno: Para crianças
Manchete: O PÁSSARO PRETO
Texto:
Uma vez um homem pobre tinha um pássaro preto que estimava muito, e, tendo um filho muito travesso, foi um dia o menino levar a comida ao pássaro e o soltou. O pássaro voou e levou o menino preso no bico. Depois de uma grande viagem largou-o num rico palácio.
...O menino, logo que o padrinho (assim chamava o pássaro) saiu, foi e abriu o primeiro quarto, e lá encontrou grande porção de cavalos... O terceiro era cheio de moças brancas, o quarto de mulatinhas e o quinto de espadas... Deu-lhe a chave do sétimo quarto e saiu o moço não se conteve e abriu o quarto onde havia um rio de ouro. Quando o pássaro voltou, deu-lhe o castigo prometido: tirou a roupa e mergulhou no rio de prata... e quando acabou, deitou-o fora de casa... O moço começou a andar e foi ter a um reino. Aí encontrou um negro velho, a quem chamou pai Gaforino, e lhe pediu que lhe cedesse a sua roupa velha e suja para encobrir a sua cor e poder entrar na cidade. O negro cedeu; mas uma princesa que estava na janela do palácio chegou a ver ele vestir a roupa velha do preto, e, conhecendo que ele se encaminhava para o palácio, disse ao rei que queria se casar com o pior negro que ali chegasse. O pai ficando admirado pelo o mau gosto da filha, não teve outro remédio senão mandar chamar o negro e contratar o casamento, com o que o moço disfarçado em negro ficou espantadíssimo, porque não pensava que estivesse sido visto por ninguém. Aceitou a princesa por mulher, e, sempre muito desconfiado não se deitava na cama com ela, e sem numa tábua ao pé do fogo. O rei teve tão grande desgosto, que pôs-se de cama em estado de morrer.
{...}
... O negro mandou que sua mulher fosse à igreja ver a festa, e ocultamente, pediu à sua varinha de condão que lhe desse uma linda carruagem e um vestido da cor do campo...
... E lá se apresentou com tanta rapidez, que a mesma mulher não podia pensar que fosse ele. As duas irmãs casadas que a princesa tinha ficaram com inveja e desconfiadas, estando na igreja diziam escarnecendo: “Com um moço assim é que tu devias ter casado e não com um negro.” Ela recebeu tudo com tristeza. No segundo dia da festa, o negro pediu a varinha de condão que fizesse aparecer, uma carruagem inda mais rica e um vestido de cor do mar, com todos os seus peixinhos... tudo isso sem a mulher saber: e quando voltaram todos da festa, já ele estava no palácio com sua roupa de negro.... Eles ficaram muito espantados, ainda mais quando o moço foi chamado para a mesa e disse que não se assentava na mesa com seus com os seus cativeiros. Então o preto apresentou-se na sua cor verdadeira, e nos mesmos trajos com que estava no dia em ferrou os cunhados por seus cativos. Então o rei lhe perguntou quais eram ali os seus escravos, e ele apontou para os seus dois cunhados, que estavam ferrados nos quartos como el-rei podia examinar. O sogro os chamou para uma camarinha, e lá ficou convencido da realidade, sendo que as mulheres dos dois moços se afiaram da varando do palácio abaixo, e eles as acompanharam, ficando o rei tão desgostoso, que em pouco tempo morreu, ficando o pai Gaforino senhor de todo o reino.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 01-09-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2304
Dia da semana: Terça-feira
Página: 2
Coluna: 1
Caderno: Para crianças
Manchete: JOÃO DE CALAIS
Texto:
Ao norte das Galias está a província da Picardia, a qual em outros tempos teve os seus príncipes soberanos e hoje é unida ao reino de França, e nas suas costas há um porto de mar chamado Calais em cuja cidade, por ser de muito grande trato, vivia antigamente um negociante abastado em créditos e cabedais...
Entre todas as artes a nenhuma se aplicou com mais gosto que à da navegação; depois de ter unido a prática à teoria, saiu o mais excelente e valoroso homem de mar dos seus tempos...
Uma tarde que se retirou mais cedo para bordo achou um navio ancorado muito perto do seu, e sobre o tombadilho dele viu duas damas ricamente ataviadas, derramando muitas lágrimas, e cujas fisionomias lhe fizeram suspeitar que fossem pessoas de muito porte; levado deste pensamento mandou-se informar cujo era o navio a quem mandava, e soube ser um corsário que, pouco havia, tinha entrado no porto, e que as duas damas que traziam eram escravas, as quais intentava vender no dia seguinte.
Porém, que admiração não foi a sua, quando elas tiraram os véus que as cobriam, e viu as duas belezas muito juvenis e capazes de enternecer o coração mais ferino!
Durante a viagem um só instante se não separava ele das suas escravas; e como era mancebo, discreto e de agradável aspecto, com pouco trabalho achou o caminho de penetrar o coração daquela que tanto tinha ferido o seu, e por tanta forma, que o não puderam encobrir um ao outro: amaram-se e manifestaram os seus interiores, e sem consultarem mais do que o fogo das suas paixões, juraram um eterno amor entre ambos.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 02-09-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2305
Dia da semana: Quarta-feira
Página: 2
Coluna: 1
Caderno: Para crianças
Manchete: JOÃO DE CALAIS (continuação)
Texto:
{...}
Logo pela cidade soaram as novas da sua chegada, e seu pai, com todos os Habitantes, o foram receber e prestar-lhes as honras devidas às suas heróicas ações.
Mas qual não foi a sua dor quando viu que seu pai desaprovava o seu casamento com Constancia! A sincera narração que ele lhe fez do seu amor para com ela, das suas virtudes, não pôde conseguir de seu severo pai perdoar-lhe o ter-se ligado com uma pessoa que lhe parecia muito sua inferior, e não omitia nenhuma diligência para o brigar a deixá-la; mas ele protestou-lhe que lhe seria mais fácil perder mil vidas, se tantas tivesse, do que separar-se dela; que lhe tinha dado a sua fé e a julgava a mais digna de todas as mulheres, que lhe havia guardar até a sepultura.
Sentidíssimo João de Calais do ultraje que seu próprio pai fazia à sua amada Constancia, retirou-se e foi viver com ela...
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 04-09-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2307
Dia da semana: Sexta-feira
Página: 2
Coluna: 1
Caderno: Para crianças
Manchete: JOÃO DE CALAIS (continuação)
Texto:
{...}
‘Verdade é que eu nunca lhe instei sobre este ponto, porque a minha alma, satisfeita com as suas virtudes; desdenha instruir-se de uma coisa que interesse pouco os corações generosos; e o meu prefere uma escrava merecedora de muitas coroas a todas as soberanas que não são dotadas de prendas tão relevantes como ela possui.
Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 10-09-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2310
Dia da semana: Quinta-feira
Página: 2
Coluna: 2
Caderno: Variedades
Manchete: MISÉRIA ALEGRE
Texto:
O mês estava a acabar. Não havia em casa senão quinhentos réis. O Ponciano, que era simples escrevente de tabelião e ganhava apenas o necessário para não morrer de fome, e para evitar que o mesmo acontecesse a D. Florinda, sua mulher, e ao Bibi único fruto do casal...
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- Resta-nos um cruzado. É quanto basta para pagarmos o bonde que nos há de levar à casa do primo Nepomuceno.
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Estavam os três – pai, mãe, filha – prontos para sair, já tinham fechado toda a casa..., quando ouviram bater palmas no corredor.
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É o primo Nepomuceno (disseram ao mesmo tempo marido e mulher).
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Entrou o primo Nepomuceno.
Entrou a senhora do primo Nepomuceno.
Entrou a cunhada do primo Nepomuceno.
Entraram os quatro filhos do primo Nepomuceno.
Entrou a mulatinha de estimação, ama seca do caçula do primo Nepomuceno.
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Tema: CONTOS
Orgão de imprensa: A BAÍA
Data da notícia: 16-09-1903
Ano: Ano: VIII
Número: nº: 2315
Dia da semana: Quarta-feira
Página: 1
Coluna: 2
Caderno: Variedades
Manchete: TESOURO
Texto:
Os três irmãos, Ruy, Guanes e Rostabal, eram então em todo Reino das Astúrias, os fidalgos mais famintos e mais remendados.
Ora, na primavera... - os irmãos de Medranhos encontraram por detrás de uma moita de espinheiros, numa cova de rocha, um velho cofre de ferro.
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Mas Guanes não se arredava do cofre,..., desconfiado, puxando entre os dedos a pele negra do seu pescoço.